Dia desses, eu tentei atravessar a pé a avenida T-63, em horário de pico, para chegar ao banco do outro lado. Eram tantos os carros e nenhuma faixa de pedestre por perto. No meu exercício de paciência e sabendo que normalmente eu estou do outro lado, dentro do carro, fiquei observando a floricultura atrás de mim, as pessoas no ponto de ônibus e, de repente, me deparei com uma mãe, dos seus 20 e poucos anos, uma menina de 3 anos e um outro ainda de fraldas, no colo. Com o corpo mirrado, mas as mãos firmes, ela me deu confiança de que eu ia conseguir passar. Se ela, com duas crianças, passaria, imagine eu, sozinha! Seria mole. Em um intervalo entre os muitos carros, tomamos coragem e seguimos correndo. Chegamos à ilha, quando a menina começou a chorar e a mãe, com a voz firme e baixa, disse:
- Vai dar tudo certo!
Os olhos da menina eram de desespero. Os da mãe eram de uma dúvida atroz. Olhei para trás e compreendi. Na nossa pequena corrida, ela perdera o celular bem no meio da pista. A mãe olhava os carros sem saber se voltava com dois meninos para o asfalto, se deixava-os sentados, no começo de noite, para recuperar o bem perdido ou se desistia. Eu olhei para ela e fui buscar o bem perdido. Fui porque reconheci nela o meu olhar de desistência, quando diante do cuidado com os filhos, às vezes a vida parece algo muito impossível.
Isso porque eu sou mãe de um menino (um só) e sonhava, em dias distantes, em ser mãe de três. Cuidar de duas crianças ao mesmo tempo e de maneira solitária, em uma cidade grande, pode ser uma grande aventura. E atender duas pessoas diferentes, com desejos diferentes, também é outra aventura. Lembro de um artigo que li da atriz Denise Fraga, mãe de dois filhos, que ao receber uma amiga em casa com um filho na barra da saia e outro grudado no peito, foi chamada de “escultura de mãe”.
Nunca me esqueci deste termo e acho que se aplica a mãe que atravessava a rua, a mãe que amamenta um filho enquanto o outro aguarda aos berros, a mãe que leva um filho para uma escola e o outro para a natação e a minha mãe que se dividiu a vida toda entre as filhas, o trabalho, os pais, os amigos, sempre ouvindo muitas cobranças sem perder o rumo e sem ter muito quem voltasse atrás para recolher um bem perdido. O que se perdia, perdido ficava. Ela sempre olhava para frente, segurava as nossas mãos, dizia só de olhar o que daria certo ou errado e de alguma forma, era um porto seguro, firme, como uma escultura deve ser.
que relato sensível... e deve ser tão fiel que cheguei a sentir aflição ao ler. e de aflição as mães entendem...
ResponderExcluirbjo!!!