terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Contratos cumpridos

Foi o ano.

Transformações. Encontros. Teatro. Diálogos. Família. Monólogos. Desencontros. Pedidos. Despedidas. Beijos. Madrinha. Lágrimas. Sonhos. Decepções. Livros. Dúvidas. Filmes. Doces. Cozinha. Amigos. Cinema. Vestido. Presentes. Vinho. Lilás. Agendas. Trabalho. Novo. Madrugada. Escola.

Com contratos cumpridos, vou seguir até 2010. Na última semana, uma pausa para atualizar os filmes vistos (vejam Abraços Partidos) e para ler o último livro (leiam Caminhos da Reportagem, dos meus amigos Deire Assis, Rogério Borges e Vinícius Sassine). E para estar, sobretudo, com quem eu amo...

Te encontro lá, em 2010!

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

E o Natal chegou...

E o Natal chegou... É esta semana! As ruas estão movimentadas, as pessoas, invariavelmente, estão cheias de pacotes nas mãos, o almoço é mais gostoso, a agenda não tem folga e o coração, bem, o coração está entrando de fininho no clima de Natal. Fiz todos os deveres de casa para sentir o sininho batendo lá dentro, mas confesso que demorou, demorou muito. Achei até que tinha perdido completamente a mão e não haveria mais encanto na data.
Arrumei a árvore no começo do mês, reuni brinquedos para doação, comprei presentes (pela internet, é verdade, e tem muito menos graça), mandei fazer umas lembrancinhas, pesquisei receitas saborosas, visitei o Papai Noel no shopping (uma única vez para o Tomás não tentar puxar a barba dele de novo!), comprei e comi panetone e disse, aleatoriamente, para algumas pessoas que não verei mais este ano: "Feliz Natal!". Mas não colou de imediato. Eu estava correndo demais, trabalhando até de madrugada, vendo notícias horrorosas pela internet, me sentindo culpada invariavelmente pelas minhas ausências, sem tempo para minúcias e isso me deixou menos natalina do que costumo ser...
Mas, no final da semana, escrever uma carta de despedida, fazer uma surpresa para quem amo e sortear uns papeizinhos fizeram um click no meu coração! Estavam faltando estes momentos de entrega, de dizer "estou aqui, Papai Noel", de colocar no meu Natal a fé que tenho que 2010 será um ano melhor, assim como eu e você.
Então, se o Natal não chegou por aí, feche os olhos, pense em algo bacana, se prepare e deixe que ele chegue por aí... Você verá como vai ser bom. E se o Natal já chegou, que bom! Quero compartilhá-lo com você.
Se tiver um tempinho, volte no tempo e acesse: http://www.youtube.com/watch?v=Msyu_7tH9eI
Esta é a minha canção de Natal favorita e hoje amanheci cantarolando...

Feliz Natal!!!!

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Ser de sagitário


Lá em casa tem um menino de sagitário e, como canta Adriana Calcanhoto, “metade gente, metade cavalo”. E ele é assim muito humano, como são “as gentes” e, elegante e livre, como deveriam ser os cavalos.

Nos seus sonhos de menino, “cavalga elegância”, sonha com o longe, constrói mundos imaginários e faz planos para outros finais de ano, quando não estarei mais por aqui. E, para ele, nada é impossível.

- Mãe, quando eu crescer, eu vou construir uma casa na lua e você vai morar nela!

É também o menino de sagitário, que nunca perde uma tirada, diz o que lhe dá na telha e não perde nunca a vontade de dizer o que pensa, a pessoa mais verdadeira que conheço.

- Mãe, mas é verdade. Eu não gosto disso.

Injuria-se com a mentira, com o tropeço, com o compromisso não cumprido. E com memória de poucos anos, ainda não gasta, se lembra, cobra e controla.

- Mãe, mas você disse que íamos sair hoje!

Fala mais do que todo mundo e, por isso, no seu “boletim” vem anotadas todas as conversas paralelas. A sua voz chega aos lugares antes que ele o faça e ele dá mais notícias do que o jornal da noite. E, ao menor sinal de desatenção, ele bate palmas e avisa:

- Mãe, você está me ouvindo?

O seu relógio é adiantado por natureza. O seu dia começa cedo, muito cedo. E se este dia for de folga, é mais cedo ainda.

- Mãe, hoje é sábado, eu tenho que aproveitar!

As suas amizades são para a vida toda. E os seus dedinhos ficam aflitos por ter de recontar os muitos que ele quer bem. Para ele, não existe colega, existe amigo e, pelos amigos, com quem ralha, briga e se desentende, ele sempre busca fazer o melhor.

- Mãe, eu não gosto muito de bolo de chocolate, mas meus amigos gostam. Então, faz um bolo de chocolate para eles.

O seu coração é doce, puro mel. E quando pequeno os seus olhos adoçavam só de olhar. E, talvez por isso, sempre foi dono de muitos amores, muito certeiros, cuja inspiração vai além do final feliz dos contos de fada.

- Mãe, ela me ama, vai casar comigo e vamos ter quatro filhos... Você sabe, mãe, de quem eu estou falando?

O seu convencimento não é vertical e nem muito fácil. Exige mais paciência do que seres adultos e bobões, como eu, são capazes de oferecer. Ele não aceita qualquer resposta ou se contenta com uma explicação banal. Ele quer compreender o mundo de onde ele acha que vem...

- Mãe, se o vovô é uma estrela de noite, de dia ele vira nuvem?

O seu amor pelo mundo também é intenso, como são seus diálogos com ele. Ele recolhe o lixo, adora as plantas, admira os prédios e as longas avenidas. Da engenharia que constrói a cidade em sua volta, ele tira explicações lógicas para quase tudo. Mas quando o mundo falha um pouco, ele se ressente com o seu dono...

- Mãe, mas por que Deus deixou cair tanta água? Não tem telha que dê conta disso tudo!

É também, neste mundo de números, cujas cifras o impressionam e regras nem sempre o beneficiam, que ele desenvolve mais o seu ar questionador. E se cada pergunta levantada por ele valesse um real, o menino de sagitário já seria rei.

- Mãe, se eu fosse prefeito, dinheiro não ia valer nada, nada mesmo.

Enquanto os números o seduzem, as classificações o deixam intrigado. Para ele, qualquer rótulo precisa bem mais do que explicação. E qualquer “lugar comum” é alvo de muitos questionamentos.

- Mãe, por que só as meninas ganham flores? Homens também gostam de flores, sabia?



É este ser de sagitário, que todo fim de ano “cruza o planetário”, que o “meu coração aguarda e acompanha” o seu rico itinerário há seis anos.



Na verdade, eu que sou mãe, filha, madrinha e afilhada de sagitarianos, me encanto todos os dias com a sabedoria, o senso de justiça e a praticidade destes seres nascidos entre novembro e dezembro.

As “pérolas” sagitarianas fazem parte da minha vida. O inconformismo, a persistência, a ansiedade, a inteligência, os ciúmes, a elegância e a liberdade destes seres me fascinam.

A coragem da minha mãe, o seu jeito de nunca se entregar, é quase que inato em meu filho. Não sei contar quantas vezes eu ouvi da minha mãe:

- Filha, se não tem jeito, a gente dá um jeito. Levanta os ombros e vamos seguindo!

Da minha madrinha, que é doce como é o Tomás, que até para puxar orelhas é gentil, a sabedoria sempre foi tão marcante.

- Minha querida, a resposta está dentro de você...

É da pequena Sofia, que hoje também aniversaria, a máxima explicação para o que vai nestes corações. A voz mais doce de todos os sagitarianos que me circulam, em certo momento me explicou um pouco da persistência deste seres.

- Luisa, mas minha mãe não entende. Eu não gosto daquele vestido. Eu gosto mesmo é deste aqui e a gente tem que vestir o que gosta!




• Para quem não conhece a música, segue o link: http://www.youtube.com/watch?v=o0pTnd0YUCY&feature=player_embedded#


• Hoje, 15 de dezembro, meu pequeno completa seis anos.







quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

À moda antiga



É só na semana que vem, mas antecipei em 13 dias, e na semana passada, o Tomás comemorou os esperados 6 anos durante a aula. Fizemos (eu, a vó e a dindinha) uma festa da forma mais tradicional, que lembrou um pouco a nossa infância, com direito a chapéu, língua de sogra, muito brigadeiro e um balão daqueles que derrama balas por todos os lados. A molecada adorou...
Tudo começou com um convite de dinossauro feito à mão com olhinhos que se mexiam. O tema decorou a lembrancinha das professoras, uma caixa recheada de brigadeiros feitos pela vovó, e a lembrancinha das crianças, uma lousa para exercitar a letra. Nesta parte, recebi a ajuda impagável da tia Deire, que ficou comigo até meia-noite fazendo laços. Na mesa, o bolo coberto de morangos escolhido pelo aniversariante, muitas balas e os dinossauros do Tomás para enfeitar. Depois dos parabéns, distribuímos laranjinhas e vixe!, foi um sucesso.
Ficou tudo lindo e a cara do rapaz... De vez em quando, a gente precisa mesmo dar moral  para a simplicidade, para os dias mornos, para o trivial.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Sobre o que os pais não podem ensinar


Como não dá para ficar uma semana toda borocoxô, segui adiante, organizando a festinha do pequeno na escola, fazendo as encomendas, cuidando da microcasa e trabalhando. No meio disso tudo, ainda tenho que educar, ensinar os valores importantes e dar muitos conselhos sobre o futuro. Foi em uma destas tentativas que aprendi que tem certas coisas pais não devem se meter a ensinar.


Têm umas três semanas que o Tomás coleciona uns bonequinhos nada haver chamados Gogo’s. É uma febre entre meninos e meninas. As pequenas miniaturas são vendidas em pacotes de dois e vêm acompanhados de figurinhas. Cada pacote custa R$ 1,50 e ele pode comprar até dois com a sua semanada. É claro que sempre tem um adulto mais afoito (no caso do Tomás, é a avó) que colabora para a coleção crescer mais rápido.

Os bonequinhos não têm mais de 3 cm de altura, são coloridos e possuem status diferentes: brilhantes, multicolors e normais. E as duas primeiras categorias são alvo da cobiça das crianças, porque são mais raras. O Tomás não entendeu isso de cara. Demorou a saber o que significava ter uma coleção, fazer trocas e guardar bem as suas preciosidades. Na primeira semana, ele fez pequenas doações. Quando cheguei à escola, a coleção que tinha 18 elementos tinha tido uma baixa de 2, doado aos amigos. Ele e os amigos estavam em polvorosa, enquanto eu perguntava o “por que” de não ter feito trocas. A mãe de uma coleguinha, que é pedagoga, chegou perto de mim e disse:

- Ah, Luisa! Eles estão tão felizes! Deixa que ele vai aprender.

Na semana seguinte, o sortudo que tinha seis bonequinhos multicolors voltou sem nenhum. Desta vez não tinha acontecido nenhuma doação. Foram trocas com um dos melhores amigos, o pequeno Oliveira, que de tão esperto dá nó em pingo d´água. Quando o Tomás chegou em casa, ficou meio cismado.

- Mãe, eu acho que eu fui meio burro...

- Que é isso, filho! Sua coleção está bonita, você ainda tem aquele que brilha no escuro e, na próxima semana, você faz mais trocas!

Chegou a semana seguinte e o Tomás já tinha quase 30 bonequinhos. Quando vou buscá-lo na escola, ele está com o maior bico. Os amigos tinham o bonequinho mais raro da coleção, o número 1. Ele não era multicolor, não era brilhante, mas os meninos tinham dito ao Tomás que este era o mais valioso. E nenhuma solicitação de troca do pequeno funcionou. As lágrimas escorriam, ele não se conformava de ser o único a não ter o boneco. E eu, de cá, pensando como ensinar que coleção é algo legal, que a gente se diverte, mas não pode ser motivo de choro.

- Filho, você tem tanto legais! Você ainda vai comprar outros e o primeiro irá aparecer!

- Mãe, mas só eu que não tenho. O Oliveira falou que não tem mais desse.

Choro para lá, palavras para cá e eu tive a ideia que não devia ter tido.

- Então, semana que vem, você chega lá e diz que o mais especial é o número 30, que este é o que todo mundo quer. Você vai ver como todos vão querer fazer trocas com você.

- Mãe, você quer que eu engane os meninos?

- Não, filho. De jeito nenhum, quero só que você faça bons negócios.

- Ah... Você quer que eu minta para eles!

- Não. Que é isso! É que você pode dizer que é especial o que você quiser. Ele é especial para você.

- Mãe, eu acho melhor a gente tentar achar o número 1 de outro jeito.

Eu também acho e fazer uma coleção tem sido um grande aprendizado para nós dois. Paciência, persistência e lábia não são virtudes familiares. Vamos ter que treinar juntos. E eu, de cá, vou treinar em dobro a paciência para ver o menino se virar sem tanta mediação.

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

O que eu vou fazer com este amor?


Saudades…. Noite passada tive um sonho e você estava lá. Sua pele macia, suas mãos geladas como costumam ser as minhas, seu cheirinho de talco, seu silêncio. Você estava deitado na cama, como ficou nos últimos anos e eu estava no telefone, te observando. Eu dizia para alguém o quanto eu sentia sua falta e perguntava o que eu iria fazer com aquele amor. E enquanto eu voltava meus olhos para você em busca de resposta, acordei com o Tomás me pedindo colo na madrugada.


Tentei de novo, pai, sonhar com você. Mas o sonho não voltou. Eu queria só sentir de novo a sua presença, eu queria no sonho fazer você falar, eu queria ouvir a sua voz, que insiste em não aparecer nas minhas lembranças, eu queria entender mais do que entendo sobre saudades, sonhos e reencontros.

Nestes dias tumultuados de final de ano, com um filho que insiste em crescer mais do que devia, ando muito saudosa. Tenho saudades de viajar com você, no final de ano, para a casa da vovó. Tenho saudades de, depois de horas dentro do ônibus, encostar a cabeça no seu colo e me render ao sono. Tenho saudades de chegar na casa dela e ver penduradas, na lareiras, as botas dos filhos que devem ter recebido presentes nos natais da sua infância. Tenho saudades de sentir o cheiro do arroz doce que ela preparava te esperando. Tenho saudades de quando você ia mata adentro achar uma pitanga não muito bonita para me mostrar que a árvore plantada por você já dava frutos. Tenho saudades de, no Natal, mesmo que sem presentes, ter você. Tenho saudades de quando, já grande, com você cambaleante, dançar um pouquinho “cheek to cheek” cantando “eu, você, nós dois, já temos um passado, meu amor”.

E queria muito saber se quem estava do outro lado, no telefone, no meu sonho, tinha resposta para minha pergunta. Afinal, o que eu irei fazer com este amor?

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Querido Papai Noel...


O Papai Noel já está recebendo cartas e mais cartas no Pólo Norte, enquanto o Tomás ainda pensa no presente que vai pedir ao bom velhinho este ano. A dúvida se instalou por causa da enorme oferta apresentada a ele pela televisão, pelos colegas, pelos folderes distribuídos nas ruas e também porque o aniversário dele é no próximo mês, o dia das crianças foi no mês passado e ele tem brinquedos mais do que suficiente. Na última doação, conseguimos encher fácil uma caixa com miniaturas, jogos e carros que já não faziam mais a alegria do menino.


Enquanto ele ensaia escrever ao Papai Noel sobre suas predileções, eu ensaio mudar um pouco o tom do Natal deste ano. Ele não sabe se quer o videogame de última geração ou a coleção de filmes do Sítio do Pica-Pau Amarelo. A dúvida ainda inclui uma pista cheia de “curvas iradas, rampas maneiras e velocidade animal da Hot Wheels, mamãe, vai encarar?”. Eu ensaio desligar a televisão mais cedo todos os dias, escrever para o Papai Noel trazer uma boa surpresa e viver com menos, bem menos.

Diante dos muitos catálogos de brinquedos, fora o videogame que é caro e eu não estou certa que este Natal contemplará, eu não vejo nada, nada mesmo, que seja um desejo indubitável, uma surpresa unânime, uma daquelas alegrias incomparáveis. Eu queria que ele fosse capaz de sentir o que eu senti quando, aos 8 anos, minha mãe me deu uma bicicleta Caloi azul. Ela era linda, sem defeitos, brilhante e causou alvoroço na minha casa. Eu quase dormi abraçada com ela e, depois que aprendi a andar, perdi três tampos de joelho, participei de muitas corridas e andei de todas as formas que eu conseguia. Está na lista dos meus melhores presentes.

O Tomás já ganhou brinquedos lindos, divertidos e encantadores. Sempre abre os pacotes com ar de surpresa e de realização. Mas o problema é que, diante da quantidade, a realização dura pouco e ele sempre está com as pequeninas mãos abertas e esperando algo cair do céu. Sei que a época de hoje é bem mais fácil do que a décadas atrás. A estabilidade econômica do País permite aos pais muito mais mimos do que tínhamos. Para se ter uma ideia, minha Caloi veio de São Paulo, de ônibus, encomendada a um amigo. Na época, as diferenças de preço eram enormes. Hoje, com as grandes redes e a internet, não faz tanta diferença assim. Fora que os brinquedos são bem mais baratos e acessíveis, inteligentes e sedutores e não há um adulto que não fique pasmo e encantado em uma loja de brinquedo.

O problema é que temos que dar um destino a tudo isso, aos muitos brinquedos, à pobreza que ainda assola outras crianças, à inutilidade de alguns objetos (o que fazer, depois de dois segundos, com a décima nona boneca), à falta de tempo para curtir tantos brinquedos. Isso tem me subtraído e não quero ficar com a cabeça branca como o Papai Noel. O Tomás e muitas outras crianças precisam aprender a consumir menos e somos nós os instrumentos. O primeiro passo é ouvir “não”. E, para isso, temos que fazer vários exercícios. Lá em casa são ditos muitos “nãos”, mas que caem por vezes no vazio. São três casas, três regras e apelos incansáveis. Todos os anos ele vai, pelo menos, em três festas de Natal. Mesmo assim, eu não posso desanimar. Tenho que reduzir a carta do Papai Noel, dar a chance do Tomás ter um brilho no olhar como eu tive aos 8 anos e viver sem me condicionar tanto ao que é dito na televisão.

Vejam este vídeo sobre consumismo infantil e pasmem com o que os pequenos andam saboreando nas horas vagas: http://www.alana.org.br/CriancaConsumo/Biblioteca.aspx?v=8&pid=40

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Tradição I



Grávida do Tomás, eu ficava “mirabolando” tradições para a nossa pequena família, porque sempre acreditei que ter uma tradição é como solidificar laços. Acho bonito ver uma família que segue uma tradição.


Não reconhecia no meu núcleo familiar nada que tivesse o peso de uma tradição. Nossas festas de Natal são pequenas, quando criança, eu e minha irmã nos dividíamos entre pai e mãe para o Natal, o almoço de domingo não segue um cardápio tradicional, não vamos à missa todos os sábados e não temos mais um destino certo nas férias. Na busca por tradições, já comprei camisetas iguais para mim e para ele, tentei contar uma história todas as noites, ir ao parque nos domingos... Mas nada pegou, não virou tradição.


Agora, que o final de ano chega e começo a cumprir as minhas atividades festivas, percebo que a tradição estava ali e eu ainda não tinha visto. A primeira tradição começa com o aniversário do pequeno, nascido em dezembro. Desde o primeiro, eu faço os convites e preparo as lembrancinhas com a ajuda de uma amiga querida e a vovó e a dindinha fazem os doces. Se a festa é maior, uma legião de tias empresta as mãos para cumprir as tarefas. Quando entra novembro, ele já pergunta o que faremos neste ano. Sempre tem uma novidade. Neste ano, a comemoração será na escola, mas já começamos a festa cortando papéis em casa.


Em seguida, começam os preparativos do nosso amigo-secreto. Tem mais de dez anos que eu e um grupo de amigas nos reunimos para comemorar o Natal e o ano novo com o tradicional sorteio de papéis. O grupo mudou, cresceu e a festa continua em nosso calendário, em algum final de semana em dezembro ou janeiro. Desde 2003, o Tomás começou a participar da brincadeira, ainda na barriga. Ganhou de presente do amigo Igor um Taz bebê, que enfeitou seu primeiro quarto. De lá para cá, ele e os amigos se divertem com a troca de presentes e de papéis. E ele espera ansioso pelo dia em que saberá quem é “seu concorrente”. As opções não são muitas, porque eles são poucos, mas o pequeno se diverte sempre.


Na onda de tradições, temos nossa pequena árvore para o nosso cantinho lá em casa. É lá que amanhece o presente do Tomás no dia 25. O papai Noel passa na vovó, onde é a ceia no dia 24, mas sempre deixa algo na nossa casa e ele espera. A árvore é montada por nós dois, em meio às discussões, porque ele gosta de fazer tudo sozinho. Então, já tive carrinhos estacionados ao pé da árvore, cartinhas penduradas nos galhos, mas tudo muito colorido e feito por nós dois, em uma manhã qualquer de domingo.


Estas e outras tradições surgiram sem um planejamento maior. Foi o prazer de repetir certas vivências que estão concretizando os laços com quem amamos. E cada uma destas coisas torna a nossa vida mais doce e mais suave. E o gosto pela tradição passa então de mãe para filho. Dia desses, ainda no final de outubro, após o último recital do ano, fomos lanchar juntos depois da apresentação. Ele e os colegas já tinham programado o passeio dias antes, porque em outros momentos de comemoração escolar, fizemos o mesmo. Foi aí que o Tomás falou:



- Mãe, sair com os amigos depois do recital já é uma tradição, né? A gente vai fazer isso para sempre.



É, meu artista, esta é mais uma das nossas tradições, uma tentativa no meio de tantas de ser e fazer feliz. E que bom que nossas tradições não planejadas têm gosto de brigadeiro, segredo e batata frita.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

O primeiro amor


- Existe idade para o amor?


- Não, Tomás. Não existe idade para o amor. Existe idade para o namoro, para o casamento. Para isso, existe idade. Idade mínima.

Este é o assunto do momento lá em casa. O pequeno nutre um sentimento muito forte por uma colega de sala da mesma idade, que é, segundo ele, sua "alma gêmea". Os dois nasceram no mesmo dia, na mesma hora e no mesmo local. E, por estes acasos do destino, foram parar na mesma sala e na mesma escola há três anos. De lá para cá, uma amizade cultivada com muito carinho e uma grande afinidade entre ambos tem sido motivo de muita conversa.

O fato é que, em um dos recreios, as duas criaturas de cinco anos resolveram fazer um pacto e prometeram um para o outro que se casariam, quando adultos. O casamento prometido, para o meu filho, se tornou motivo de planos. A casa que iria construir, a lua-de-mel que iria passar em Paris (!?), os muitos filhos que teria... Eu ria sempre e falava com ele que era muito cedo para pensar nestas coisas. A resposta dele não era lá muito educada:

- Eu não tenho culpa se você não casou.

Tá certo, eu não casei. Mas também fiz planos, filho, só que maior. Aos cinco anos, eu lembro da chegada da minha irmã em casa, de pular uma janela para fugir e brincar, de mudar de casa, do Sítio do Pica-Pau Amarelo e das visitas da minha madrinha. Só... Não me lembro de nenhum amor.

Mas, para o Tomás, que confessou seu amor e fez compromissos futuros, isso não é algo que deva ser guardado em diário ou bilhetes anônimos. E deve ser sacramentado e levado muito à sério. Eis que, ainda no auge do seu amor, a amiga desfaz o compromisso. Foram três dias de muito jogo de cintura em casa. O menino fervilhava de raiva, de angústia, como um adulto após um "fora". E eu estava ficando pirada com aquilo, mesmo que os especialistas digam que isso é normal, que o namoro entre crianças é apenas uma reprodução e que a gente deve dar pouca atenção ao assunto. Só que na prática o discurso não ia nada bem, nada convencia o Tomás a
não dar importância.
- Mãe, mas ela prometeu.

- Filho, não dá para você saber com quem irá se casar. Dá para você saber apenas quem vai ser seu amigo no futuro. Porque as amizades começam a ser construídas agora.

- Mãe, mas ela não quer nem me ouvir.

Isso ele disse com lágrimas nos olhos. Eu encerrei meu discurso e, no dia seguinte, falei com a professora. Pedi intervenção, porque o caso tinha se tornado motivo de "zoação" no intervalo. Pedi para ela conversar, explicar que era tudo muito cedo. No mesmo dia, chego para buscá-lo e lá está o menino, feliz. A professora me diz que resolveu, conversou. Eu, depois de tantas tentativas sem sucesso, fico me sentindo fracassada, mas não quis perguntar como ela tinha conseguido a proeza. O fato é que os amigos tinhas feito as pazes e o problema estava sanado.

Naquele mesmo dia, chego em casa e ele abre a pasta. Sai de dentro dela um desenho, feito pela amiga. Não sei qual foi o recado, a orientação da professora, mas que as pazes não foram feitas por causa disso, não foram mesmo...

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Amor ou amizade? Amor e amizade?


Recebi a foto de um amigo (com um único crédito no cantinho da imagem: KSB). Divido com vocês para que, no final de semana, a gente encontre um pouquinho disso tudo nos caminhos que vamos trilhar e que estes encontros rendam boas histórias.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Locação de dinheiro


Voltei ao desafio de tentar dar alguma educação financeira para o meu filho, coisa esta que se recebi, nunca assimilei. Temos conversado muito sobre o tema, sobre os valores, sobre a moeda corrente e toda sexta-feira, ele recebe sua semanada, para administrar seus desejos mais recorrentes: balas, picolés, revistas. Mas também para guardar e investir em projetos futuros: videogame, viagem e a coleção do Star Wars. Diante do pouco poder de aquisição do seu recurso semanal, o pequeno já quis que dinheiro não valesse nada e que todos pudessem trocar, já quis que todos tivessem dinheiro suficiente e já quis só ele ter todo o dinheiro do mundo.
Mas o que mais aflige o menino é porque para quase tudo o dinheiro é importante. Se quer ir ao cinema, dinheiro, se quer lanchar fora, dinheiro, se quer um brinquedo, dinheiro. Eis que, na sexta, indo para a locadora, onde ele investiria uns reais na locação de um filme, ele me diz assim:
- Mãe, avisa para eles que a gente vai locar o dinheiro, mas que é para eles devolverem quando a gente devolver o filme, tá?
- Como assim, filho?
- Ué, a gente loca o dinheiro para eles, né?
- Não, filhote, a gente paga para locar o filme. A gente devolve o filme, mas o dinheiro é o pagamento pelos dias que vamos ficar com ele.
- Não acredito! Eles nunca te devolveram o dinheiro dos filmes?
- Não, meu amor. Este dinheiro, eles usam para pagar os funcionários, os novos filmes, a locadora e para ter lucro.
- Como existe gente ruim neste mundo, mãe. Eles usam o nosso dinheiro para pagar as contas deles! E quem vai pagar as nossas?

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Ensinamentos


Daquilo que eu não posso deixar de ensinar ao meu filho antes que ele ganhe o mundo com suas próprias pernas ou que não haja tempo nem sintonia suficiente entre nós dois:


- Agradecer a vida, a família e os amigos;

- Ter portas e janelas sempre abertas para o mundo, onde tudo acontece, inclusive o ruim, mas especialmente o bom;

- Que não existe tamanho insuficiente ou sonho impossível;

- Caminhos tortuosos podem ter boas chegadas;

- A dizer o que sente e a ter sentimento sobre o que dizem;

- Os humanos são diferentes porque pensam, mas também porque fazem amizades;

- Um amigo sempre pode dizer a verdade para o outro e um amigo sempre é capaz de ouvir a verdade do outro;

- Para ser amigo, há que ter tempo, carinho, cuidado e mimos;

- Que a nossa casa é o melhor lugar do mundo e que se ela estiver cheia, quanta alegria;

- No silêncio, reside o descanso;

- E, no barulho, a alegria;

- Nos olhos brilhantes de alguém existe amor e, por este amor, devemos ser gratos, senão é possível ser recíproco;

- Amar dói, às vezes, mas sem amor, nada é possível;

- Andar de mãos dadas, rir sem motivo, conversar à toa não tem idade.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

A carta de um pai

Sábado, Rio de Janeiro, um jovem de 26 anos estrangula e mata a namorada de 18 anos. Os nomes são comuns: Bruno e Bárbara. As trajetórias também são iguais a de muitas pessoas que conhecemos. Tinham família, estudaram, cresceram protegidos. Em algum momento, ele, viciado em crack, surtou e assasinou a mulher que amava, que queria vê-lo melhor. O que fazer quando algo assim acontece? Como os pais vão lidar com esta dor? Como a gente, que tem filhos, sobrinhos, pessoas que amamos, vai protegê-los do consumo cada dia maior de drogas?
Hoje, pela manhã, quando vi o pai de Bruno na televisão se sentindo impotente diante do erro do filho, pensei no quanto estamos desprotegidos neste mundo. Quem me garante que estou fazendo certo com o meu filho? Quem fará justiça por este homem, que criou seu filho, que tentou fazer tudo certo? Ninguém. Nem a ele, nem aos pais de Bárbara, porque o pior aconteceu. E, muitas vezes, o pior tem acontecido em famílias de bem. É como o pai diz: o filho destruiu duas famílias. E isso não tem preço, não tem graça, nem sentido algum.

A seguir a carta publicada por Luiz Fernando, o pai, no jornal O Globo:


"Meu filho começou na droga pelo álcool, no colégio, esta droga LEGAL com que a propaganda bombardeia nossas crianças e jovens todo dia, escancaradamente, e que produz milhares de mortes no trânsito, destrói lares, pessoas do bem e é, como se sabe, a primeira droga que os jovens experimentam. A maioria segue pela vida em maior ou menor grau se drogando com ela, o álcool, outros acabam provando das ilegais, sendo que uns fogem delas, outros se viciam numa espiral crescente e veloz. Em geral, passam pela maconha, vão na boca adquiri-la, e os comerciantes, felizes, lhes oferecem um variado cardápio, self-service: cocaína, crack, haxixe, êxtase, ácido...
Sei que há seis anos perdi meu filho para o crack, mas apesar das sequelas e problemas, ele nunca deixou de ser carinhoso e educado com todos, o que lhe granjeou um número sempre crescente de amigos.
Ele passou por várias internações - tinha, desde pequeno, outros problemas mentais que se exacerbaram com as drogas. Sempre que saia das internações ficava bem. Até encontrar os amigos, tomar umas cervejas e ai a coisa saía novamente de controle. Nestes tempos o vício, apesar de grave, ainda não tinha produzidos todos seus efeitos devastadores. Mas, com o tempo e a reincidência, o crack foi o devastando. Nos últimos tempos, dizia-se derrotado para o vício, vivia muito deprimido e voltara a frequentar o NA, Narcóticos Anônimos. Tentei de tudo para convencê-lo a se internar, mas vai pedir para um pinguço largar sua garrafa. É inútil. Ele foi cada vez mais descendo a ladeira. De mãos atadas, fiquei esperando pelo pior ou por um milagre, já que segundo os "especialistas", que ditam as políticas públicas para o tratamento de drogas, o drogado tem de se internar por vontade própria.
A reportagem que o Brasil assistiu esta semana, da mãe que construiu uma cela em casa, para tentar salvar o filho viciado em crack, é bem representativa de como as famílias vítimas deste flagelo estão abandonadas pelo Estado, e se virando à própria sorte. É bem possível que ela seja punida por isso. Na mesma reportagem, uma psicóloga inteligente afirmava que o viciado em crack tem de vir voluntariamente para tratamento. Este é o método correto, segundo a maioria dos que estão à frente das políticas para esta área. Será que essa profissional é incapaz de entender o estrago que o crack/cocaína ocasiona nas mentes de seus dependentes? Será que ela é capaz de perceber o flagelo que o comportamento desses doentes causam sobre as famílias?
Um drogado, ou adicto, que já perdeu o senso de realidade e o controle sobre sua fissura, torna-se um perigo para a sociedade, infernizando a família, partindo para roubos, prostituição e até assassinatos, por surto ou por droga. Esperar que uma pessoa com a mente destruída por droga pesada vá com seus próprios pés para uma clínica é mera ingenuidade destes profissionais. O Estado tem de intervir nesta questão para preservar as famílias e os inocentes. A internação compulsória para desintoxicação e reabilitação destes doentes, que já perderam todo o limite, é uma necessidade premente. Ou será que todas as famílias que vivem esse problema terão de construir jaulas em casa?
Meu filho destruiu duas famílias, a da jovem e a dele, além de a si próprio. Queria sair do vício, mas não conseguia. Eu queria interná-lo à força e não via meios. Uma jovem, a quem ele amava, queria ajudá-lo e de anjo da guarda virou vítima . Se meu filho fosse filhinho de papai, como falaram, eu já teria pago uma ou mais internações. Mas infelizmente o papai aqui não tem grana para isso, assim como a maioria das famílias vítimas deste, que insisto em reafirmar, flagelo.
Hoje vi uma pessoa boa se transformar num assassino, assim como aquele pai de família correto, que um dia bebe umas redondas, dirige, atropela e mata seis num ponto de ônibus.
As drogas, ilegais ou não, estão aí nas ruas fazendo suas vítimas diárias, transformando pessoas comuns em monstros e o Estado não pode ficar fingindo que não vê.
Dizem que vão gastar 100 milhões para equipar a polícia, mas e as vítimas diretas das drogas como ficam? E os jovens humildes atraídos pelos criminosos para seu exército? E os policiais mortos em combate nesta via indireta da guerra do tráfico? Está na hora de acabar a hipocrisia!
Meu filho destruiu duas famílias, a da jovem e a dele, além de a si próprio. Queria sair do vício, mas não conseguia. Eu queria interná-lo à força e não via meios. Uma jovem, a quem ele amava, queria ajudá-lo e de anjo da guarda virou vítima.
Ele irá pagar pelo que fez, será feita justiça, isso não há dúvida. O arrependimento já o assola, desde que acordou do surto do crack deu-se conta do mal que sua loucura havia lhe levado a praticar. Ele me ligou, esperou a chegada da polícia e se entregou, não fugindo do flagrante. Não passarei a mão na cabeça dele, mas não o abandonarei. Ele cumprirá sua pena de acordo com a lei, dentro da especificidade de sua condição.
Este é um caso de saúde pública que virou caso de polícia. Infelizmente, só consegui interná-lo pela via torta da loucura, quando já não havia mais nada a fazer, num surto fatal. Este é um caso de saúde pública que virou caso de polícia. Que a família da Bárbara possa um dia perdoar nossa família por este ato imperdoável. Chorei por meu filho 6 anos atrás. Hoje minhas lágrimas vão para esta menina, que tentou por amor e amizade salvar uma alma, sem saber que lutava contra um exército que lucra com a proibição (que não minimiza o problema, pelo contrário, exacerba), por um bando de tecnocratas e suas teorias irreais, e para um Estado que, neste assunto, se mostra incompetente."

Luiz Fernando Prôa, o pai

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Bocejo


- Mãe, é feio bocejar na frente da professora?

- Filho, tenta disfarçar, coloca a mão na boquinha, vira de lado. É porque parece que você não está gostando muito do que ela está falando, entendeu?

- Não, mãe. É porque eu estou com sono mesmo.

Tá. Eu gosto de horário de verão, de chegar em casa ainda com sol, mas o começo, ai, ai... É muito difícil!

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Árvore genealógica


A cena era passeio do dia das crianças, que começou cedo lá em casa. No banco de trás do carro, meu filho e mais duas crianças: o Pedro e a Maria Eduarda, ambos com seis anos. O programa era tomar café-da-manhã juntos e aproveitar os novos brinquedos. Mas com miniaturas de gente não dá para fazer previsões. E também não dá para ficar em silêncio. A primeira pergunta veio logo:

Tomás - Mãe, o que eu sou do Pedro?

Parênteses. O Pedro é filho do meu cunhado e enteado da minha irmã. Não sou genealogista. Vou pelo bom senso que é o que me resta neste mundo com poucas regras.

Eu - Primo. Ele é filho do seu tio, então é seu primo.

Tomás - E da Maria Eduarda? Também sou primo?

Segundo parênteses. A Maria Eduarda é prima do Pedro, sobrinha do meu cunhado. Neste momento, eu tentei responder, mas as vozes começaram a se atropelar e o diálogo a seguir ficou bem mais entrecortado.

Eu - Ela é nossa amiga, filho. Prima de coração.

Neste momento, devia ser igual aos filmes e todo mundo ficar em silêncio, com uma música de fundo e o tempo passando do lado de fora. Mas não foi o que aconteceu.

Tomás - Tá, mais e a vovó? Também é vó dela? Ela deu presente para a Duda, sabia?

Meus pequenos companheiros daquele dia têm muitas coisas em comum e também dúvidas e anseios sobre a eternidade dos laços com quem ama. Ambos não moram com o pai e com a mãe juntos e dividem suas agendas mirins em visitas ao pai, à mãe ou à avó. Em algum momento, todos já tiveram madrastas ou padrastos. Quando começam a falar, tentam dar nomes, funções, regras ao que não têm regra. Enquanto tentavam ter certeza se eram primos, se havia um laço que os tornasse para sempre amigos e cuja sombra da separação não ameaçasse, dialogavam aflições e expunham a complexa realidade das famílias do dia de hoje.

O pequeno Pedro, meu recém-sobrinho, mora com a mãe e o padrasto, que chama de pai de criação. A Maria Eduarda mora com a avó e o pai, na mesma rua que a bisavó, no mesmo bairro que a mãe. O Tomás mora comigo.

Pedro - Luisa, eu tenho dois pais, um de sangue e outro de criação. Mas um dia eu vou morar com o meu pai, sabe?

Eu - Sei, Pedro. O papai também te cria, né? Ele ajuda, está presente e quer muito ter você sempre por perto, né?

Pedro - É, eu quero morar com ele um dia.

Tomás - Eu não quero não!

Eu - Às vezes, quando a gente é pequeno, é melhor estar perto da mãe da gente. Mas isso não quer dizer que a gente não possa ficar com o pai, né? Vocês têm pais que gostam de vocês, mas é que as mães são muito importantes. (Tentando desfazer um nó imaginário de abandono ou qualquer coisa semelhante e fazendo outro nó maior ainda).

Maria Eduarda - Só eu que não moro com minha mãe. Eu também queria morar com ela. Tipo assim: às vezes, ela podia cuidar de mim. (Atou as pontas a falante Maria, para quem eu não teria nenhuma resposta).

Eu - Mas você vê sua mãe a hora que quer, né, Maria? E tem várias pessoas que te amam muito?

Finalmente, chegamos. Coloquei os três para carregar sacolas e tudo mais que tinha no carro, para que se ocupassem reclamando do peso, enquanto meu coração aos pedaços e com bem mais do que os 20 quilos de cada um, pesasse o dia todo.

Me explica se um pobre genealogista poderá explicar aos herdeiros de Maria Eduarda e Pedro em 2100 que, na árvore deles, existiam algumas pessoas cujos nomes estavam além dos laços sanguíneos e das explicações plausíveis sobre o que significa ser família no começo deste século.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Meu pequeno sonoplasta

Ele tem só 5 anos, mas são muitos os planos para o futuro. As carreiras de engenheiro, construtor, arqueólogo e prefeito já estão certas. Ele tem a certeza infantil de que elas se combinam e se completam. “Mãe, um prefeito que pode ele mesmo fazer o asfalto, é muito melhor. E se eu descobrir dinossauros e fizer um museu. As crianças vão gostar, sabia?”. Sabia e sei desde que ele mexe e remexe nos toquinhos de madeira para fazer a construção de vários prédios ou ainda quando ele fica sem piscar os olhos vendo a propaganda da Prefeitura de Goiânia.
O que ele não sabe é que de todas as suas vocações, a que mais se torna evidente a cada dia que passa é a de sonoplasta. Para o desespero dos familiares, dos vizinhos ou de qualquer um que passar por perto, o Tomás guarda em sua pequena garganta um arsenal de sons que provavelmente faria muita inveja aos produtores de filmes da Pixar. É um tal de “ráiatchapif” que não acaba mais. Barulhos para batalhas, quedas, carros, guerreiros imaginários, etc. Já sabendo da sua queda por tantos barulhos, sempre escolhemos os presentes sem som. Assim ele mesmo sonoriza os seus últimos bonequinhos ou ainda o navio pirata perdido por sete mares.
O problema é que nem todo mundo segue a regra e, no último dia das Crianças, eis que surge a poderosa e temida espada de Jedi em forma, cor e som. O seu barulho estridente e alto poderia ser suportado, não fosse a insistência dele em acompanhar a música dos “iááss” da espada em movimento. Enquanto pedimos insistentemente silêncio e armamos planos para sumir com a espada, ele segue feliz na sonorização das suas brincadeiras, sempre garantindo aos que estão em casa a certeza de que ele está presente.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Escultura de mãe






Dia desses, eu tentei atravessar a pé a avenida T-63, em horário de pico, para chegar ao banco do outro lado. Eram tantos os carros e nenhuma faixa de pedestre por perto. No meu exercício de paciência e sabendo que normalmente eu estou do outro lado, dentro do carro, fiquei observando a floricultura atrás de mim, as pessoas no ponto de ônibus e, de repente, me deparei com uma mãe, dos seus 20 e poucos anos, uma menina de 3 anos e um outro ainda de fraldas, no colo. Com o corpo mirrado, mas as mãos firmes, ela me deu confiança de que eu ia conseguir passar. Se ela, com duas crianças, passaria, imagine eu, sozinha! Seria mole. Em um intervalo entre os muitos carros, tomamos coragem e seguimos correndo. Chegamos à ilha, quando a menina começou a chorar e a mãe, com a voz firme e baixa, disse:
- Vai dar tudo certo!
Os olhos da menina eram de desespero. Os da mãe eram de uma dúvida atroz. Olhei para trás e compreendi. Na nossa pequena corrida, ela perdera o celular bem no meio da pista. A mãe olhava os carros sem saber se voltava com dois meninos para o asfalto, se deixava-os sentados, no começo de noite, para recuperar o bem perdido ou se desistia. Eu olhei para ela e fui buscar o bem perdido. Fui porque reconheci nela o meu olhar de desistência, quando diante do cuidado com os filhos, às vezes a vida parece algo muito impossível.
Isso porque eu sou mãe de um menino (um só) e sonhava, em dias distantes, em ser mãe de três. Cuidar de duas crianças ao mesmo tempo e de maneira solitária, em uma cidade grande, pode ser uma grande aventura. E atender duas pessoas diferentes, com desejos diferentes, também é outra aventura. Lembro de um artigo que li da atriz Denise Fraga, mãe de dois filhos, que ao receber uma amiga em casa com um filho na barra da saia e outro grudado no peito, foi chamada de “escultura de mãe”.
Nunca me esqueci deste termo e acho que se aplica a mãe que atravessava a rua, a mãe que amamenta um filho enquanto o outro aguarda aos berros, a mãe que leva um filho para uma escola e o outro para a natação e a minha mãe que se dividiu a vida toda entre as filhas, o trabalho, os pais, os amigos, sempre ouvindo muitas cobranças sem perder o rumo e sem ter muito quem voltasse atrás para recolher um bem perdido. O que se perdia, perdido ficava. Ela sempre olhava para frente, segurava as nossas mãos, dizia só de olhar o que daria certo ou errado e de alguma forma, era um porto seguro, firme, como uma escultura deve ser.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Mudanças



“Tudo que se vê não é

Igual ao que a gente

Viu há um segundo

Tudo muda o tempo todo

No mundo”

Lulu Santos


O mundo a minha volta mudou. Virou de cabeça para baixo, tomou banho de chuva, fez cachos e está, assim, completamente diferente. E não foi só ele quem mudou, foram as pessoas à minha volta, fui eu... E tantas mudanças nos obrigam a mudar de lugar, a se reposicionar e a refazer laços antigos. Dá muito trabalho. Muitas vezes diante de um nó, aparentemente bem feito, encontramos muitas mágoas, coisas deixadas para trás, poeira escondida debaixo do tapete. E, às vezes, é quase certo que para refazer o laço é preciso cortar um pouquinho, diminuir as pontas, deixar a fita aberta para perder as marcas... Em outras ocasiões, os laços se desfazem e se refazem sem que a gente se dê muita conta. Daí, um dia à tarde, o telefone não toca, você sente um silêncio e pensa “no que estava ali há um segundo”.


Tenho vivido isso intensamente. 2009 está sendo um ano de mudanças. Não são apenas partidas, são chegadas, mudanças diversas. Meus amigos, minha família, está tudo tão diferente. Os vizinhos de porta, mudaram-se todos. Duas grandes amigas preparam as malas e lá se vão... para São Paulo, rumo à uma nova vida. Minha irmã está casada e agora minha família vive em três endereços diferentes nesta pequena grande cidade. Meu filho será alfabetizado. Minha amiga de infância ganhou dois filhos de uma só vez. E foi tudo tão rápido...

Quando há uns meses atrás, nos reunimos para comemorar os dez anos de formatura, atrás da mesa, para fotos, tinha homens e mulheres com sorrisos de meninos e meninas. É, ando nostálgica, um bocado. Estou sentindo muitas saudades das pessoas como elas eram, de mim como eu fui um dia, das risadas que eu dei, dos amores que senti, das dores que resolvi. Não há tédio, nem tristeza nesta saudade, apenas um pouquinho de dor porque a cada mudança a gente separa um pouquinho para guardar nas caixas de recordações. E ganha um pouquinho, é certo, para levar adiante. Mas estou exatamente abrindo a caixa para guardar os passeios sem compromisso, a sobremesa na Richesse às 13h40, as letras de música na contracapa do caderno, as balinhas furtadas na aula, as caronas para as festas, a torta de sorvete, as horas no telefone...

Hoje não tem histórinha do Tomás. Também, pudera... O Tomás só tem 5 anos. Ele só quer saber se o dente dele irá cair amanhã, se o dia das crianças é amanhã, se o céu estará nublado amanhã. E, eu? Bem, eu quero saber onde eu guardei o dente perdido aos 12 anos, se os meus amigos sentem saudades também, se o vestido dos meus 6 anos ainda pode existir em algum canto do mundo, se o pirulito Zorro era mesmo o melhor pirulito do mundo e se para nostalgia existe remédio, além do tempo. Mas, sinceramente, acho que é como uma onda e já irá passar.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Além do arco-íris...

Fiquei quatro dias fora. Foram oito ligações. Foram oito parênteses na saudade, como sempre são. Mas, em um destes parênteses, eis que a voz deste menino curioso que tanto se parece comigo me faz despencar para outra Luisa que um dia eu fui.

- Mãe, adivinha que personagem eu vou ser no recital da escola?

- Não sei, filho. Qual vai ser a peça?

- O Mágico de Oz. Adivinhou?

- Pela sua alegria... Acho que o Mágico.

- Isso! Não é incrível! Quando você voltar loca o filme para a gente ver juntos?

Sim. Eu loquei. E lá se foi o meu domingo em frente à televisão vendo o filme rodar em sépia para depois colorir, além do arco-íris. Me lembrei muito da menina que existia em mim e que acompanhava com olhos vidrados a décima exibição de Dorothy na sessão da tarde, enquanto imaginava fugas mágicas para as minhas tristezas infantis. Enquanto a música voltava na minha cabeça e as mãozinhas dele apertavam as minhas, ele me disse assim:

- Mãe, sabe do que eu mais gosto neste filme?

- Do mágico, claro!

- Não. É de quando ela diz assim: “Não existe melhor lugar no mundo do que a nossa casa!”

- É, também gosto muito desta parte.

- Mas bem que a gente podia morar atrás da lua.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Vôos curtos


Viajei a semana toda com um questionamento engasgado na garganta. Não sei por que os filhos precisam pensar tanto...

- Mãe, bem que a gente podia ter uma família completa, né?
- Filho, o que é uma família completa? Você acha que a nossa família é incompleto?
- Mãe, uma família completa tem que ter um pai, uma mãe, um irmão mais velho, um irmão do meio e um irmão pequeno.
- Ah... Então a sua é quase completa. Tem um pai, uma mãe e uma irmã, né? E tem ainda uma avó, uma dinda e uma porção de gente que te ama.
- É, mas só que famílias completas de verdade moram juntas.

“O pensamento parece uma coisa boa, mas como é que a gente voa quando começa a pensar”, já dizia a música.

Lá em casa, via de regra, meu filho não vê novela, nem coisas do gênero. Na programação infantil, os desenhos têm famílias diferentes, irmãos que viajam para terras distantes e super-heróis imbatíveis de cores e sexos variados que vivem sozinhos por opção. Só não consegui fugir dos pais “comercial de margarina” do desenho Caillou. Na escola, não existe dia disso ou daquilo, existe dia da família. Nos livros, os personagens não seguem padrões. Na sala de aula, os colegas têm as mais distintas formações familiares e tudo é dito com muita clareza pelos educadores.

Mas não sei em que momento a família cristã padrão fisgou o meu filho. Mas fisgou de jeito. Este foi apenas um dos questionamentos de uma fileira que ele me expôs. E, mesmo recebendo sempre respostas diretas e objetivas, o pensamento está ali, imposto. Não chega a lhe arrancar o sorriso ou a leveza da infância, apenas o incomoda.

Para a família completa de “comercial de margarina”, ele mesmo arrumou uma solução.

- Então, o jeito é ser irmão mais velho mesmo. Daí ou você ou meu pai precisa arrumar um bebê.

- Mas tem famílias com dois irmãos, também, né? Como a minha...

- É, mas a minha precisa de um outro irmão, para morar junto comigo.

- Tudo bem. Vamos ver isso mais para frente.

E, por enquanto, vamos tentando vôos curtos com pensamentos longos. Enquanto ele pensa o porquê de não poder ser assim, eu penso o porquê de não ser suficiente do nosso jeito.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Tempo

Tempo, tempo, tempo, tempo
Vou te fazer um pedido
Tempo, tempo, tempo, tempo”

(Caetano Veloso em Oração ao Tempo)


Impossível explicar o tempo, que arma surpresas, que arranca suspiros, que aflige os pensamentos, que consome as horas, os minutos e os sonhos, que se multiplica em salas de espera.

Mas que, majestoso, é imprescindível aos seus súditos e é senhor de nossos pedidos, anseios e desejos. Ah... o tempo...

- Mãe, quanto tempo falta para o meu aniversário?
- Filho, faltam três meses, já está chegando?
- São quantos dias, mãe?
- 90 dias.
- Puxa! Como eu queria ter nascido no primeiro dia do ano!

Xxxx

- Mãe, você me leva para pegar um filme hoje!
- Filho, não dá! A mamãe tá correndo muito, tem mil coisas para fazer, você não está vendo? Eu estou completamente sem tempo e dia de filme é sábado.
- Mãe, para você todo dia é segunda-feira?

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Para sempre



- Mãe, posso te perguntar uma coisa?

- Claro, filha, o que você quiser!

Passos apressados rumo ao balé. Mãos entrelaçadas, umas nas outras. Morgana para, respira e pergunta:

- Mãe, toda vez que você sair, você vai voltar?

- Vou, filha. Toda vez eu vou voltar para nossa casa.

- Eu estou falando sobre todas as vezes que você sair. Quero saber se você vai voltar?

As mãos se apertam. Os corações ficam miúdos.

- Filha, todas as vezes que eu vou, você vai comigo, no meu coração. Então, se eu não voltar, você estará lá comigo.

- Mãe, se você não voltar, eu vou ter que sair do seu coração, porque você sabe, né? E eu quero que você volte sempre, porque eu fico muito triste longe de você.

Estas foram, mais ou menos, as palavras de Morgana, 8 anos, para a sua mãe Simone. Quando a mãe me contou, me deu aquele aperto e fiquei pensando assim que Drummond tinha muita razão quando dizia: “Fosse eu Rei do Mundo, baixava uma lei: Mãe não morre nunca, mãe ficará sempre junto de seu filho”. Esta aflição consumiu dias da minha infância e, agora, me consome adulta, porque eu gostaria de sempre voltar e de que ele estivesse, ali, me esperando.

*Para sempre – Poesia Carlos Drummond de Andrade

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Flores de agrião



Sim, elas existem. São comestíveis e, por um acaso, deliciosas. São vermelhinhas com miolo amarelo. Belíssimas as flores de agrião mexicanas, que encontrei ontem em um verdurão da cidade. Elas se bastavam para pôr a beleza necessária para os meus convidados da noite.

Às vezes, uma novidade assim, tão simples, faz com que a gente pense nos caminhos complicados que percorremos para conseguir agradar o outro, dar o nosso melhor. E eu, que adoro pequenos detalhes, corro sempre o risco de me perder por inteiro no todo.

Segue mais um diálogo daqueles antes que a salada ficasse pronta. O cenário é a sala do apartamento. Eu, empunhando bravamente o aspirador. Ele, tentando fazer suas manobras no videogame emprestado diante do barulho insuportável do meu ajudante móvel.

- Mãe, por que você gosta de tudo tão perfeito?

- Porque é bom tudo perfeito, no lugar, não?

- Não sei.

- Claro que é, filho. A casa limpinha, a mesa bem posta, a cama arrumada.

- É, é bom. Mas nem tudo tem que ser tão perfeito, sabia? Às vezes, você podia deixar ser...

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

O que é felicidade, meu amor?





Então, me diga, por favor, o que é felicidade. Porque algo me diz que o dicionário sabe pouco sobre o seu significado. E também não é disciplina do ginásio ou do ensino universitário. Talvez quem já tenha doutorado, sabe o que é, mas como eu não cheguei lá, ando matutando com minha graduação uma boa explicação.
Não está escrito em nenhuma página do meu “Aurélio” que felicidade é estar perto de quem se ama, de preferência, rodeado dos seres amados. Nem que felicidade é ver quem você ama muito, mas muito feliz e se você puder colaborar com “uma mãozinha”, ai, daí é algo grandiosamente feliz. E que se esta pessoa realizar um daqueles sonhos mais secretos, você ganha uma fatia da felicidade como se fosse um pedaço de bolo.
E se você, com muito medo de algo dar errado, em um momento que você se esquece de que pode dar certo, visualiza os passos corretos e firmes de quem você ama no caminho perfeito, ah... Aí é explosão de felicidade, mesmo sem estar escrito no dicionário.
Também não foi registrado em nenhum dos sinônimos da felicidade a saudade. Porque depois, pôr fim a ela com muitos abraços e beijinhos é capaz de te deixar estranhamente plena. E é ainda mais estranho que não esteja escrito que a lembrança de dias felizes nos faça ainda assim felizes para sempre.

- Filho, se comporte, por favor! Hoje é um dia muito especial para todos e eu não quero ficar chamando sua atenção.
- Mas por que é tão especial?
- Porque foi um dia muito sonhado e desejado, porque estão todos felizes. É um dia muito feliz.
- Mãe, hoje é o dia mais feliz do mundo?
- Para alguém, com certeza, sim.
- Ah... E qual foi o seu dia mais feliz do mundo?
- Foi o dia que você nasceu.
- E o meu, foi o dia que eu te escolhi.

Apenas porque não existem medidas para esta tal felicidade, eu perdi a capacidade de dizer quantas vezes fui feliz. Porque medidores, réguas, calendários, sinônimos e antônimos não são capazes de explicar o amor, que é o motor da minha felicidade. Dias felizes são compartilhados sem preocupação com a capacidade ou o fim deste recurso infinito e batem na nossa porta sem agenda.
Eu vou rasgar a página do dicionário que diz que a felicidade é “ventura, contentamento”. Com certeza, hoje sinto mais que isso. Abri a porta e deixei entrar.


terça-feira, 25 de agosto de 2009

Impotente


No dicionário: que não pode; fraco, débil. No coração: é aperto sem tamanho, lágrimas quentes no rosto, mãos atadas sem assim estarem. Há, com certeza, um grupo no mundo que se sente mais impotente do que o restante da humanidade. Este grupo é formado por mães, de todas as nacionalidades, tipos, pesos, religiões, mas todas com a mesma sensação diante dos seus filhos. A sensação de que não vão conseguir dar um passo adiante, uma resposta, uma solução para o que aflige a alma dos seus pequenos. A impotência dói muito na gente e em quem a gente ama e talvez devesse entrar na lista do pior que existe no mundo.

Eu me sinto assim toda vez que me deparo com a incerteza do futuro, com fórmulas que não dão certo, com dias cinza entre eu e o meu filhote. E, nestes dias e nestas noites, em que o sono some junto com o sorriso, com a paciência, com a serenidade, eu sempre acho que fiz tudo errado, que escolhi tudo errado e que não terá nada capaz de corrigir o estrago já feito. E penso que ele não será elegante, independente, generoso e, o pior de todos os anseios, não será capaz de ser feliz.

É... Eu me sinto impotente e dói me sentir assim. E diante da impotência, que ninguém é capaz de compreender ou dividir, eu fico quase prostrada: eu e eu com minha dor. Até que um moleque de cinco anos passa feito um vento no meio da sala, fala algumas palavras no meu ouvido e segue gargalhando ao encontro dos seus brinquedos favoritos é que me dou conta que o tempo ainda é generoso comigo, que eu ainda posso ensiná-lo o que ele não aprendeu e que eu ainda posso aprender com ele o que todas as crianças sabem desde sempre: que as coisas podem ser mais fáceis, porque não somos tão fracos assim. Aliás, não existe fortaleza maior do que a da maternidade. Pena que memória de mãe, de tão gasta, às vezes, é curta.

* Pintura de Picasso representando a maternidade.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Gentileza III


Para terminar a minha semana de reflexões dedicada a gentilezas, vou falar uma coleção preciosa, que só uso em grandes momentos como se faz com jóias de família. É uma coleção de gentilezas que guardo para aqueles momentos em que ficamos meio borocoxô e não se reconhece muito o valor que se tem. Daí, eu fecho os olhos bem apertados, respiro fundo e deixo vir um destes instantes tão poderosos que me fazem sentir algo tão bom, tão bom, que só mesmo uma gentileza é capaz. Alguns destes momentos, eu vou catalogar para não perder a minha mania de lista, mas não necessariamente estão organizados assim ou citados aqui:
- A primeira volta de bicicleta no Clube de Engenharia, com meu pai me seguindo e me apoiando antes das quedas;
- As mãos da minha prima Ana Cristina me segurando, no rio, para me ensinar a nadar, sem desanimar com o meu desajeito;
- Um vestido branco, encomendado por minha mãe, com uma renda branca na gola para o meu aniversário de seis anos. Foi a roupa mais bonita que eu já tive;
- Os biscoitos fritos da minha avó Ana, no final da tarde, no último dia de férias, todos os anos antes da sua partida;
- A colcha bordada de tulipas com ramos enormes pela minha tia Maria, de um ano para o outro, presente perfeito;
- As cartas da minha madrinha, com selos de diferentes lugares do mundo, mas com o carinho e sabedoria de sempre;
- As trocas e os empréstimos de roupas entre eu e a Carolina, na adolescência. Ela, sempre mais antenada do que eu, me vestia com muito dom;
- As ligações, que não falham nunca, vindas de Brasília da minha amiga Indira;
- As muitas caronas para levar meu pai ao médico ou socorre-lo em momentos de crise. Gente que não tem o nosso sangue, mas tem algo maior conosco;
- Os longos cafés com minha amiga Deire, nos anos bem passados;
- Uma cantoria linda, na minha janela, quando eu fiz uns 20 anos. Amigos afinados e perfeitos em guardar segredo, escolher repertório e me deixar corada;
- Dois convites para ser madrinha. Primeiro do Vinícius e depois da Dri;
- Dois outros convites para ser madrinha de casamentos importantes e únicos;
- Os copos d´água que minha secretária Annielly colocava na mesa para que eu não desidratasse na gravidez;
- O empenho de dois amigos para fazer uma faxina antes da minha mudança, enquanto eu fiquei sentada feito uma pachá, com a desculpa da gravidez;
- A minha médica me ameaçando ligar para minha mãe caso eu não engordasse um quilo no mês seguinte, no meu pré-natal;
- O chá de casa nova “surpresa” organizado por amigas empenhadas e carinhosas;
- A correria da minha irmã para embalar de última hora as lembrancinhas de nascimento do meu filho e comprar roupas que vestissem seus 2,6 quilos;
- Todos os convites das festas do Tomás, feitos por mãos habilidosas de amigas tão queridas. E as ajudas que recebi para organizar as festas, do primeiro ao mais recente;
- As muitas mãos firmes que me ampararam no dia que meu pai se foi;
- A bandeja cheia de copinhos descartáveis com gelatina colorida que a Marta prepara toda vez que meu filho vai ficar na sua casa;
- As duas primeiras viagens que fiz com a Carlinha e o Pedro para Brasília, no banco de carona, aprendendo a viver;
- O copo de chá, em cima da bancada, toda vez que meu filho chega na casa da minha mãe;
- Os desenhos e pinturas do Tomás que enfeitam minhas paredes e minhas gavetas;
- Os encontros de amigas do dia 10.
Não sei se eu merecia tanto, mas dou a estes e outros momentos e fatos da minha vida um valor imensurável. Sou grata a estas pessoas, próximas ou distantes, por me ensinarem o valor da gentileza, de gestos pequenos e grandiosos que me fazem até hoje sorrir.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Gentileza II

Se as cidades e as casas tivessem seus muros e suas paredes cobertas de palavras de gentileza será que seríamos mais capazes de perceber o que é realmente necessário? José Daltrino, o profeta Gentileza, acreditava e vivia isso. Talvez seus cinco filhos tenham aprendido com ele o básico: amorrr (como ele escrevia), perfeição, beleza, bondade e sabedoria. A música acima está sempre tocando no meu fone de ouvido e foi bem lembrada pela minha afilhada Dri, em post anterior.

Às vezes estamos tão absortos nas tarefas cotidianas, no ir e vir da cidade, nas obrigações maternais e profissionais, que não dá tempo do básico. Temos que nos preocupar com o vil metal, com a violência que assola o mundo, com o fim dos recursos naturais, com a sucessão presidencial, com a gripe suína, com o modelo adotado pela escola, com a última pesquisa sobre o desenvolvimento da mente humana.

Outro dia, meio assim, sem querer dizer, ele me disse:

- Se eu sorrio para você, mamãe, você deve sempre sorrir para mim, né? Sim, filho.

Gentileza gera gentileza. E se eu fizer o contrário, por favor, me corrija...

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Gentileza I




Ensinamento


(Adélia Prado)


Minha mãe achava estudo a coisa mais fina do mundo.

Não é.

A coisa mais fina do mundo é o sentimento.

Aquele dia de noite, o pai fazendo serão, ela falou comigo:

"Coitado, até essa hora no serviço pesado".

Arrumou pão e café , deixou tacho no fogo com água quente.

Não me falou em amor.

Essa palavra de luxo.

x x x x x
Minha mãe também não me falou nada sobre o amor, nem a gentileza que envolve amar e ser amado. Não me falou de como deveríamos tratar e ser tratado. Mas bastava que eu, espirrasse ou amolecesse o corpo, para ela fazer a sua tradicional gemada com hortelã. Talvez a minha avó também não tivesse dito nada a ela sobre este luxo, descrito por Adélia Prado. Mas ela, provavelmente, reparou nas latas de biscoito escondidas na parte mais alta do armário para quando os netos chegassem em casa ou ainda nos miúdos da galinha, separados ainda na cozinha, para quem como eu, faz questão. Não há como mesmo falar de amor, dizer de certas gentilezas que aquecem o estômago e também o coração, porque estas não têm muita explicação. Talvez por isso, quando acordo em dia que nem é santo, e a minha mesa está posta por um guri de 5 anos com pratos e talheres para alimentar um batalhão, penso que sempre dá para ensinar o necessário em silêncio, em silêncio. E que uma mesa bem posta, um bolo bem feito valem mais do que mil palavras...

*Sempre Adélia Prado. Volto à ela depois da minha semaninha insone, de um final de semana mais tranquilo e depois de ler o blog da Nina sobre o amor feinho. Queria ser tão essencial quanto ela.

Foto: Deire Assis
Produção: Luisa e Tomás para grandes amigos

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Noite de paz

Sim. Eu tenho insônia e já faz muito tempo. Ela melhora. Ela piora. Junto com o meu humor. Às vezes não durmo pensando no boleto não pago, na palavra não dita, na ligação não feita. Às vezes não durmo porque o olho seca e a mente acelera. Às vezes não durmo porque os carneiros nunca acabam e contar até 100 de trás para frente me deixa perdida. Às vezes não durmo porque tenho palpitações e nunca sei do que se trata. Às vezes não durmo porque os travesseiros (são 3) ficam de mal de mim e não se ajeitam. Às vezes não durmo porque a cortina bate na parede e faz barulho. Às vezes não durmo porque o sonho é tão ruim que prefiro os livros da cabeceira. Às vezes não durmo porque já é tarde para quem irá acordar tão cedo. Às vezes não durmo por causa do trabalho atrasado e pensar nele é inevitável. Às vezes não durmo porque a dieta me rouba calorias e sono. Às vezes não durmo porque espero, espero e o sono não vem. Mas quando rezo, noite sim, noite não, imploro para dormir sem sonho, sem sobresaltos, sem interrupção por pelo menos uma noite, uma noite de paz.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Atchim!


Saúde, pelo amor de Deus. Não vá adoecer logo agora, quando parece que todo mundo vai morrer de forma inevitável ao virar a esquina e eu não posso viver sem você. Então, por favor, lave as mãos dez vezes ao dia, compre álcool gel e carregue para onde for, evite comer fora de casa, mantenha uma certa distância de qualquer um, suspenda demonstrações de afeto e prefira sempre por telefone do que pessoalmente.
Sim. Fiquei neurótica da semana passada para cá. Depois que uma amiga recebeu um email da escola do filho dela falando das precauções no retorno às aulas, eu dei uma pirada geral. Agora, o filhote vai com a sua própria garrafinha d´água para a escola, proibi o parquinho de areia e o lanche da lanchonete, compartilhar está um pouco em desuso e lavo as mãos dele sempre que posso. Com as amigas, é o primeiro assunto do dia. Tenho que me preocupar com quem está e com quem não está no grupo de risco. A que está gravidíssima está poupada de qualquer agenda em público. Quando fui a São Paulo, na semana passada, recebi a orientação de levar álcool gel e máscaras (o que não achei para comprar) e olhava para os lados para ver se tinha alguém espirrando.
Eu tentei, tentei muito evitar ler o que se falava do assunto. Mas fui pega. Minha tia, de Brasília, diz que é mais propaganda do Tamiflu do que outra coisa. Na contramão, dois amigos da família contraíram o vírus, sofreram e sobreviveram. Desde a época que trabalhei na saúde, sei que a gripe mata muito, principalmente os pobres e/ou idosos pela falta de defesas e de assistência adequada. Sei que a vacina, em quase todos os casos, é uma grande aliada. Mas quando uma doença nova chega, ganha proporções midiáticas, mata futuras mães de famílias e o seu filho, longe dos seus olhos, coloca a mão na boca 100 vezes por dia, você tem que pedir outras 200 vezes que ninguém espirre por perto e que se espirrar, saúde...

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Benditos dias de aula


Enfim, acabou. As doces férias do meu filhote tiveram um final hoje e voltamos ao batidão: casa da vovó, trabalho, casa da vovó, escola, trabalho, casa da vovó, nossa casa. Na verdade, voltou o batidão dele, porque eu não tive muito sossego nestes dias das férias deles. Aliás, férias de filho deveriam ser férias compulsórias da mãe, porque haja criatividade, paciência e animação para inventar programações nos seus poucos minutos de folga e ainda aturar a frustração deles com a nossa pouca disponibilidade.
Ainda assim rolou uma colônia de férias, uma viagem de dois dias, passeios nas casas das tias, circo, clube, cinema, coleguinha dormindo em casa, lanchonete e, para finalizar, uma grande banana split. Ufa!
Diferente do Filipe, do Quino, o Tomás adora o retorno e entrou na escola todo serelepe com a pasta nova na mão. Abraçou a professora e disse que estava com muitas saudades e, provavelmente, estava, porque ninguém tem mais paciência com ele do que ela. E porque as tardes em frente à televisão na última semana já não estavam tão divertidas.
Que Deus abençoe todas as professoras das salas infantis! Que elas permaneçam sãs para dar conta dos nossos filhos! Que elas tenham descansado o suficiente e tenham energia de sobrar para os pequenos! Que eles aprendam muito, o necessário para mudar o mundo! Que agora ele durma mais cedo quando chegar em casa e não pergunte o que vamos fazer amanhã! E que ninguém adoeça, porque não consigo parar de pensar no risco que esta meninada corre na escola! Que sejam benditos todos esses dias de aula!

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Fábrica de dinheiro



Ainda no encalço da nossa vaga na calçada da fama, eis que me deparei com algo que só revelarei a vocês, porque de resto pode gerar algum mal entendido e problemas com a justiça.
Domingo, deixei o Tomás na casa da avó e fui com minha irmã ver, pela última vez, a mesa de bolo do casamento. Voltamos duas horas depois para almoçar e continuar com os preparativos, que têm me consumindo muito e, por isso, tenho deixado o filhote um pouco em segundo plano. E para explicar a ele a situação sempre justifico que precisamos ajudar a dinda a gastar pouco.
O fato é que ao entrar em casa a sala estava um caos, com papel, canetas, lápis de cor e tesouras espalhadas por todos os cantos. E meu filho estava alegre e faceiro jogando os tais papéis para cima. Eu, com a minha pouca paciência de costume, perguntei:
- O que é isso, Tomás? Que bagunça é essa?
- Mãe, você não vai acreditar! (Realmente, eu não estava acreditando).
- Eu estou rico, mãe! Eu fiz dinheiro!
Os tais papéis no chão estavam cortados em formato retangular, coloridos de verde, com símbolos estranhos e números seguidos de muitos zero. A explicação dele para a minha cara de espanto foi:
- Mãe, são verdinhas, são dólares! A gente tá rico!
Depois das explicações sobre a lei e as formas legais de se conseguir dinheiro, o pequeno perdeu a alegria, guardou os lápis de cor e com a cara fechada disse:
- Que pena, mamãe! Que pena!
A prova do crime foi devidamente destruída, assim como as ilusões financeiras dele... Se tudo fosse feito com criatividade, imaginação e lápis de cor, o mundo seria bem mais perfeito.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Calçada da fama

Indo para a casa da tia Fátima no aniversário do tio Maurício, Tomás confabulava planos para o futuro, quando me disse:- Mãe, já pensou se eu fosse famoso o tanto que ia ser bom?
- Por que, filho?
- Eu ia chegar nos lugares e nem ia dizer quem eu era. O porteiro da tia Fátima ia deixar eu subir sem perguntar nada.
- Sei... E daí?, disse eu querendo minimizar os efeitos da calçada da fama.
- Eu não ia pagar contas e eu ia dar autógrafos. E você não ia trabalhar.
- Bom, neste caso, seria excelente, filho.
Cinco minutos depois, chegamos ao prédio da tia Fátima e o porteiro falou:- Vai subir, dona Luisa?
Eu não resisti e quis tirar onda:- Viu como a mamãe é famosa?
- É, mas continua pagando conta, né?
Fazer o que se meu nome não está na calçada da fama, se o meu filho não virou celebridade e se as contas conhecem de cor e salteado o meu endereço. Pelo menos para elas, eu também sou famosa.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Lista


Cheguei no 15 de julho com aquela sensação de meio do ano. No elevador, a conversa era “nossa, já chegou o meio do ano!”. Na farmácia, a caixa disse “já estamos em julho e eu nem vi metade do ano passar”. Minha mãe me disse: “esse ano está mais rápido do que o outro”. Aí... Cheguei em casa, cuidei das tarefas do lar e como o sono não veio, resolvi abrir a lista. A lista é formada pelas 16 coisas que resolvi priorizar para 2009 para não chegar com a sensação de vazio que às vezes me persegue. Listei no último dia do ano, ia coloca-la no guarda-roupa, mas não sei porque cargas d´água, ela ficou dobrada na pasta de couro que nunca uso.
Abri a lista para ver como eu estava no andamento das coisas, mas também para entender o que era prioridade seis meses antes e agora não é mais. Descobri que começar foi fácil, que empaquei onde sempre empaco e que mudei muito nos últimos meses.
Dos 16 itens, dois estão fora, dependiam demais de terceiros e foram um exercício para minha confiança... Nove itens estão em andamento pleno com adaptações. Um item já não é mais tão importante, eu estava muito exausta quando o priorizei. Dois itens dependem da minha paciência, então vou me comprometer mais com ela. E três itens são fiéis às listas de quase todo mundo (economizar, malhar e estudar), mas ainda estão nos planos de setembro.
Até dezembro acho que chego bem perto dos 80%, o que será muito bom.Não estavam escritos na lista, mas faziam parte dela e estão em pleno êxito: ler um livro por mês, ir mais ao cinema, fazer novos amigos, cozinhar, reciclar, ousar um bocadinho, ser mais irmã da minha irmã, organizar minha casa... E todos me fizeram muito bem, obrigada, e vão deixar a lista, no balanço final, com as graças divinas, com aproveitamento 100% do seu objetivo principal: sorrir mais.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Trechos de uma viagem

Viagem de dois dias para seguir o delírio de uma mãe/tia em busca da realização dos sonhos do seu filho e do seu sobrinho para ir na Ciranda Discovery. No caso, eu não era a delirante, fui só a acompanhante da minha amiga Carla, grávida de seis meses e mais animada do que duas de mim. A Ciranda Discovery é um evento do Discovery Kids, um canal pago para crianças de até 6 anos, que tem os desenhos mais fofos que já vi.
Fomos lá, domingo pela manhã, o tio, a tia, o primo Pedro, a mãe e o Tomás. Enfrentamos filas, maratona, corrida, manha, fome, cansaço, mas saímos vivos e com diploma de exploradores na mão. No caso, só os pequenos ganharam os diplomas. Nós ganhamos diplomas imaginários de “aventureiros” do ano.
Mas o melhor da viagem são sempre os diálogos, o que diverte a gente em qualquer lugar.

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Comunhão de ideias
Logo depois da saída de Goiânia, as primeiras frases:

- Vai demorar?
- É mesmo, mãe, vai demorar muito?
- A culpa é do papai que dirige muito devagar.

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Filas

Este não foi um diálogo. Foi só uma cena quase muda. Chegamos ao shopping às 10h40. Ficamos na fila para entrar no shopping. Eu em uma porta. O tio em outra entrada. As portas se abriram às 11h20. As crianças e a grávida foram preservadas.
Na hora que a porta abriu, eu corri mais que tudo para conseguir um bom lugar. Ficamos entre os 30 primeiros. Eu ganhei do tio (oh!).
Os ingressos só seriam liberados às 13 horas. Nos revezamos, eu e o tio, na fila quando um monitor nos avisa, 10 minutos antes, que como a tia estava grávida, estávamos na categoria preferencial e não precisávamos ficar ali.
- Mãe, você ficou na fila, mas foi a tia Carla que conseguiu os ingressos, né?

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Pergunta

Enquanto eu estava no meu momento folga da fila, com os dois meninos entediados, eis que o Pedro me faz a pergunta que não quer calar.

- Tia Luisa, por que você escolheu ter filho e não filha?

- Eu não escolhi, Pedro. Foi papai do Céu.
- Mas o que você achou?

O Pedro vai ganhar uma irmã em novembro. Estas crianças...

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Clarice
Como nós não conseguimos ser os primeiros da fila, nem fora, nem dentro do evento, quando finalmente entramos no circuito, o Tomás tomou a frente e foi o primeiro da fila. Olhou para mim, piscou o olho e disse:

- Você não precisa se preocupar, que agora eu tomo conta!

Como primeiro da fila foi o primeiro a ouvir a pergunta do monitor:

- Como é o nome da clara do ovo?

Ele respondeu prontamente:

- Clarice!

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Ilusão

A gente quer entrar no sonho deles... abusar da imaginação e acabamos com cara de...

Depois de seis horas no shopping, finalmente, fomos nos despedir do Doc, o cachorro apresentador do canal Discovery. O Pedro diz para o pai:

- Pai, por que ele não abre a boca?
- Ele está cansado, filhão. Já deu tchau para muita gente.
- Não, pai. É porque ele é um boneco

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Conta

Foram só 50 minutos de circuito, duas horas de viagem, muitas broncas e filas depois e a gente tinha que faturar em cima dos poucos minutos de fama. Então, era o Doc é legal, o Doc é bacana, o Doc isso, o Doc aquilo. O pai disse:

- Pedro, não foi bacana encontrar com o Doc?
- Foi e eu vou contar para ele que você não quer mais pagar a Sky e que não vai ter mais Doc lá em casa.

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Dia seguinte

O Tomás conseguiu amarrar um pé de sapato e saiu gritando pelo apartamento o seu “feito”. Só que ao tentar o segundo pé, o desastre estava feito e o choro ficou incontido e estridente.
Fui ao banheiro com ele tentar manter um diálogo que o tirasse da manha em que se encontrava.
- Filho, a gente não sabe tudo e não precisa chorar por isso!
- Mas eu queria saber amarrar, eu queria saber, mãe!
- Filho, a mamãe não “dirige” avião e nem por isso ela chora.
- Se eu fosse você, eu chorava.

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Volta

- Vai demorar muito para chegar?

Nem sei quem disse. Mas chegamos muitas fotos, risos e choros depois. Férias de julho para guardar na lembrança.